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sábado, 3 de maio de 2014

Rosa Tattooada: bate-papo com Jacques Maciel antes do show no Ocidente

Para estreiar uma série de entrevistas que serão publicadas aqui no blog com artistas gaúchos, nada melhor, para começar com o pé direito do que entrevistar uma das lendas vivas do rock nacional, Jacques Maciel, o frontman da banda de hard rock gaúcha Rosa Tattooada.
E o cenário não poderia ser melhor, o Bar Ocidente, patrimônio cultural de Porto Alegre, poucas horas antes da banda se apresentar na casa de shows no dia 01/05/14.



Rocks- Conte-nos como foi seu primeiro contato com o Rock?

Jacques Maciel - Tenho a sorte de ter três irmãos mais velhos, e através deles em 76/77 tive meu primeiro contato com o rock através de  Peter Frampton, com o rock  progressivo através do Rick Wakeman, e na mesma época  ouvi também disco music, por influência deles.

Rocks - E quando você resolveu formar uma banda?

Jacques Maciel - Com 10, 11 anos um amigo dos meus irmãos apareceu com um disco do Kiss lá em casa, o "Alive II". Quando eu vi o encarte e o cara me disse " Esse cara aqui cospe sangue, cospe fogo, eles voam"; e eu com 10 anos, vi a cara dos caras, e me apaixonei na hora e ai que começou a fissura por rock mesmo. Aquela fissura de comprar disco, colecionar, conhecer, pesquisar sobre o assunto. Isso foi em 1980.

Rocks -  Falando em Kiss, como foi abrir o show deles aqui em Poa?

Jacques Maciel - Abrir o Kiss foi um sonho. Foi em novembro de 2012.
Depois de abrirmos eles é que decidimos que não abriríamos mais nenhum show internacional.
Já tinhamos tido experiências de abrir os show do Guns N' Roses, Deep Purple, Alice Cooper, mas o convite para abrir o Kiss foi o ápice. Tanto que depois de abrir para eles decidimos não abrir  mais para nenhuma banda internacional. Sentimos que estavamos com a abertura de bandas internacionais cumprida. E foi legal, a gente foi muito bem recebido pelo público, a galera cantando junto com a gente. A produção do Kiss foi maravilhosa, eles fizeram questão de nos conhecer, mandaram chamar a gente no camarim deles, fizemos uma foto, tudo meio no improviso, mas foi a realização de um sonho.

Rocks - Imagino que você já esteja cansado de falar...Mas é impossível pensar no Rosa Tattooada e não lembrar de  "Inferno Vai Ter Que esperar". Ainda mais tendo em vista que muitos dos leitores dessa entrevista não sabem da história desse clássico do rock gaúcho e nacional. Nos conte como foi a criação deste hit? 

Jacques Maciel - O "Inferno vai ter que esperar" é uma música que já tem mais de 23 anos, na verdade ela é uma parceria minha com o Thedy Corrêa, a letra é do Thedy do "Nenhum de Nós"
Aconteceu bem naturalmente. Um belo dia eu estou na casa do Thedy  e ele me apareceu com a letra da música escrita numa folha de caderno, e falou:
"Cara, tu quer essa letra pra ti? O pessoal  da banda não gostou dela.
Eu respondi: Tá! Porque? E ele respondeu: É só uma história, não tem refrão, ela não se repete.
Levei no ensaio do Nenhum de Nós e os guris não gostaram.
Quer  pra ti essa letra? E eu falei: Quero!
Cheguei em casa, sentei no meu quarto com o violão e fiz a música na hora, em 15 minutos. E aí nós gravamos ela  na segunda demo da banda. Levamos a música na rádio Ipanema e acabou que ela começou a tocar em formato de demo na Rádio Atlântida também. Sem gravadora, sem nada. E ela acabou  entrando na programação das rádios, assim...Naquela época acontecia dessas coisas, a música tocava na rádio por que os caras gostavam, não tinha o jabá de botar dinheiro. Foi um fenômeno. Não temos nenhum problema em falar, em tocar ela. Nos orgulhamos do "Inferno Vai Ter Que Esperar". Essa música  foi responsável por um monte de coisa boa que aconteceu com a banda. E a  gente toca até hoje, a gente não cansa. Sempre tocamos ela com o maior prazer, com o maior orgulho.

Rocks - Qual é o segredo para o Rosa Tattooada se manter tão atual?

Jacques Maciel - O segredo é não parar de produzir; e  não ficar agarrado ao passado.Tem muitas bandas da nossa geração que terminaram e voltaram, não vou citar nomes aqui. Bandas que fizeram um revival e voltaram, mas não fizeram nada novo. Nós não. A gente tem aquela base do hard rock dos anos 70, aquela influência glam dos anos 80 do Mötley Crüe, mas não ficamos presos só à essas influências.Nos atualizamos ouvindo coisas novas e tendo sempre  a preocupação de produzir  material novo, gravar discos com músicas inéditas. Isso é o que mantém a banda.


Rocks - E o público da banda, é formado atualmente por quem? 

Jacques Maciel- Estatisticamente falando 90 % do público que vai aos nossos shows, que consome o Rosa Tattooada é composto por um público que tem menos de 25 anos de idade. A galera daquela geração que iniciou curtindo o Rosa desde o início curte, respeita, mas não vai aos shows, não interage tanto. Na verdade o nosso público se renovou junto com a banda. O nosso público é o mesmo que vai assistir a "Tequila Baby", a "Cachorro Grande", "Matanza", "Pitty".

Rocks - Voltando onde tudo começou...

Jacques Maciel - Aqui no Ocidente foi a primeira vez que nós tocamos individualmente. A primeira vez, propriamente dita que nós subimos num palco foi abrindo "Os Cascavelletes" em Caxias do Sul. Na época, eu e o ex-baterista da banda, o Barea, trabalhávamos de roadie pra eles, então fizemos a abertura do show da banda. E aqui no Ocidente, no final de abril de 1989, nós fizemos nosso primeiro show individual. Foi um show antológico, se tu olhar nos perfis da banda, tem fotos desse show aqui há 25 anos atrás. Eu pensei: "vamos fazer um lance histórico, vamos voltar onde a gente começou". Eu como único membro original da primeira formação da banda, pra mim hoje tá sendo uma noite muito emocionante, muito especial.O Ocidente é como se fosse, lá fora, o Whisky a Go Go que é um bar pequeno que também é um clássico. Então montamos um setlist que passeia por todas as fases da banda, dando uma ênfase ao material do disco novo que é realmente o que a gente está trabalhando, que é o "XXV". É um feriado, um tempo chuvoso mas quem vier hoje vai curtir um show diferente do Rosa, para os guris até que não, mas eu me sinto em casa aqui no Ocidente. Frequentei muito a casa nos anos 80.

Rocks - Quais são os projetos da Rosa Tattooada para o ano de 2014?

Jacques Maciel - Lançamos recentemente três clipes do disco novo que são:"Rezar não vai te livrar do fim", "Sonho Bom" e "Chuva de Estrelas" que tem a participação do Nei Van Soria.
Continuaremos esse ano com projetos envolvendo clipes. Hoje em dia a internet torna as coisas muito descartáveis. Um álbum com seis meses já é considerado velho. A gente chegou a cogitar de gravar um DVD, mas mudamos de opinião. Resolvemos ficar fazendo clipes do "XXV" ao longo de 2014, entendemos que isso vai oferecer um tempo de vida mais longo para  o álbum, e sempre a cada 2, 3  meses se terá uma novidade. Essa coisa de imagem é muito forte hoje em dia por causa da internet, do Youtube
E assim as pessoas vão absorvendo mais o disco, na medida que vão vendo os clipes.

Rocks - Tem algum furo para o blog, alguma new publicável?

Jacques Maciel - Em primeira mão te comunico que vamos gravar o clipe da "Cerveja e Rock N' Roll" que irá ser produzido pelo Alex Milesi, responsável pelo clipe de "Rezar não vai te livrar do fim". A letra fala de um outro bar que a gente curte muito, o Malvadeza Bar", antigo Dr. Jekill, e o clipe vai ser filmado lá. Outra novidade é que a gente vai fazer uma campanha de captação de recursos que outros artistas tem feito ultimamente. Um crowdfunding, financiamento coletivo, em parceria com a Colateral Filmes que já produziu clipes do Nei Van Soria  e aí faremos o clipe de "Tardes de Outono", que é um clássico do Rosa. Essa música é bem antiga e também foi um sucesso de execução nas rádios e  nunca foi contemplada com um clipe, e a galera que curte a banda gosta muito dessa música. Então tivemos essa ideia de captação de recursos para esse clipe com o apoio dos fãs através do Catarse.me. Vai ficar no ar 60 dias essa campanha. Planejamos umas recompensas bem legais para os fâs.Vai estar tudo no site da banda, já fizemos um vídeo apresentando o projeto. Acredito que em breve estará disponível, ainda não tem a data definida, mas acredito que mês que vem já esteja.  É uma tendência atual o uso dessas plataformas de financiamento coletivo, vários artistas como Vitor Ramil, o Nei Lisboa em parceria com a Rádio Ipanema nesse momento está com um projeto utilizando esse tipo de financiamento.



Rocks - Você foi indicado para o prêmio Açorianos de Música como Melhor Instrumentista - Gênero Pop por Rosa Tattooada "XXV", me fala sobre essa indicação.

Jacques Maciel -  Vou te ser sincero, não fui lá no Araújo no dia.Com todo respeito, nunca toquei para ganhar troféu. Meu clima não é esse. E também não me considero instrumentista. Fiquei até meio perplexo com a indicação Instrumentista é o Duca Leindecker que gravou o disco dele e  tocou todos os instrumentos, é um puta instrumentista. O  Frank Solari também é um instrumentista. Eu não, eu sou um guitarrista!! Toco Rock!! Fiquei faceiro com a indicação.Se tivesse rolado, é claro que ficaria muito agradecido, muito feliz. Só por terem lembrado de mim,  já fiquei feliz. Eu imaginava que se houvesse alguma indicação do Rosa Tattooada ao Açorianos seria algo vinculado  à capa do disco, ou ao álbum de forma geral. Eu não esperava a indicação, foi bacana.

Rocks - Lí um artigo onde o Paulo Cássio disse que pretende um dia voltar a fazer parte do Rosa Tatooada, como membro fixo. 

Jacques Maciel - O Paulo mora há muitos anos em Nova York, 13, 14 anos por ai...A gente ficou muitos anos sem se falar e agora há pouco tempo, graças ao Facebook, a gente se reencontrou.
Vimos que apesar do tempo e da distância a amizade,  a história toda que a gente construiu continuava a mesma. Fiquei muito feliz e emocionado quando ele em outubro do ano passado pegou um avião e veio de lá de Nova York e veio tocar com a banda no Opinião no show  de 25 anos do Rosa. Depois ele ainda foi com a gente pra Xangri-lá e tocou novamente com a banda num encontro de motociclistas. E isso tudo reacendeu aquela chama.
Eu disse pra ele, que o Rosa é um trio, que eu não pretendo ter outro guitarrista na banda, a vaga é tua. O dia que tu quiser voltar, o lugar é teu.  É  só vir e sair tocando. É só se adaptar; por que a banda fez um monte de coisas sem ele. Ele  por enquanto não tem planos de voltar, ele tá radicado lá nos Estados Unidos.
Mas é isso...Se um dia o Rosa for ter um outro guitarrista, vai ser por que ele voltou para a banda. Fora
 ele o Rosa permanece nesse formato de trio, pois acho que é uma coisa diferente, é bem crú, obriga os caras a se puxarem mais. E tem funcionado, o "XXV" provou isso, os fãs aprovaram também.
É algo que a gente já tinha experimentado em 2001  no álbum "Carburador".
Mas é isso, a vaga é do Paulo e o dia que ele quiser voltar e só chegar e sair tocando!!


Rocks - Gostaria que tu deixasse um recado para essa gurizada que está iniciando na música, no rock.

Jacques Maciel - Primeiro quero agradecer o espaço.
E o recado que quero dar é  uma receita meio velha, meio manjada, mas acreditem é a pura verdade.
Acreditem nos seus sonhos, sem se prender à moda,  sem  se prender à tendências, sem ansiedade, sem pressa.  E tendo em mente que o rock no Brasil, apesar de existir há tantos anos é algo marginal. O rock é para uma minoria, mas é para uma minoria como eu digo...O roqueiro é uma minoria muito esclarecida que não se deixa enganar, que não compra CD no chão por 2, 3 reais. E quando tu descobre o rock, vira roqueiro,  tu pode ter 10 anos como eu , tu vai ser roqueiro a vida inteira.
Se atirem mesmo, acreditem no som, no que vocês fazem, mas sem ansiedade, sem expectativa que aconteça isso ou  aquilo. Por que a realidade do nosso país é essa. O rock é um lance underground ainda .
A Rosa existe por causa dos fãs, por causa da internet. Não dá  mais para contar com rádio ou televisão como antigamente.
Amem o Rock na sua forma mais pura, sem ficar esperando grandes retornos, deixe que isso aconteça naturalmente.Tem bandas que estouram depois de 8/ 10 anos, tem bandas que estouram com 6 meses e também ficam mais um ano e acabam. Tem banda como a gente que passaram por tudo, por altos e baixos.
Tivemos um boom com gravadora, depois tivemos um tempo sem atuar, voltamos com nova formação. E hoje estamos na luta aí junto com tantas outras bandas.
O Rock é isso, é uma luta...Tem que gostar e acreditar!! E é isso!!

Rocks - Muito obrigada, Jacques, pela honra de poder bater esse papo tão agradável contigo.





Fotos: Henrique Borges


( Poa, 01/05/2014)